12 de setembro de 2009


Logo que entrou em casa, sentiu o delicioso perfume floral. Ela sentia o gosto do ar doce, e ao olhar pro lado, avistou seu cachecol vermelho. Era dali que o cheiro se propagava. Sentou-se devagar. Então vieram aquelas cenas, uma a uma. O dia era cinza, naquele cinza costumeiro e dono de uma perfeição incomparável. Existiam duas coisas além do mesmo céu. Existiam gotinhas minúsculas que caíam pintando seus fios de cabelo escuro. O frio era habitual, não era de tanta importância como a chuva fraca. Era nublado também, escuro. Mas o que a fazia lembrar de tudo isso era a outra coisa que até ali não fazia parte do seu espaço clássico e sentimental. Era alguém. Ela lembrava que a partir daquele dia chuvoso aquele alguém fora por muito tempo uma espécie de razão de viver. Era o seu primeiro namorado. Foi quando ela abriu os olhos e viu que as cenas se passaram em um sonho. Ela estava com frio, as horas tinham se passado em uma velocidade incalculável. Tudo continuava intocado, da mesma maneira que antes. Somente o tempo não tinha parado, incessante, sufocante. Hoje ela era mulher, parecia ter uma vida de fábulas, de poemas, uma vida tratante e corriqueira, parecia falsa. Mas ela sabia que era real, muito além de um beliscão no braço que chame do sonho à vida. Concomitantemente com sua vida adolescente, podia jurar com precisão as recordações das noites mal dormidas e de uma agenda escolar que, ao contrário de anotações de provas, guardava palavras intensas. Como era confortante estar ali, deitada no escuro, no sofá da sala. Apesar do frio, ela estava no macio de Londres. Levantou e não ousou ligar a luz, foi até o banheiro e tomou um banho quente, depois deitou-se novamente e abriu uma antiga caixa que guardava seus sonhos irreais. Ali ela encontrou coisas que não lembrava, e depois de passar os olhos devagar, percebeu que não queria vê-las naquela hora, e a fechou.