18 de maio de 2010

O dia estava mais escuro. As horas se arrastaram e quando o céu foi desbotando suas cores noturnas, seus olhos foram de encontro a outros. Já acreditava que de tanto caminhar, era mais do que hora de bater seus olhos em olhos de pupilas vivas, pulsantes. E foram neles que encontrou o inesperado. Eles eram verdes, muito embora parecessem de um escuro mais exótico, e eram convidativos. A mulher londrina passou devagar a mão pelos cabelos negros e deu um sorriso embaraçoso, cheio de disfarces. Quem era ele? A princípio parecia alguém tão sem procuras, sem objetivos, que deixar-se enganar pelos olhos e pelos lábios era pura inocência, uma inocência pura. E dos lábios dos dois nasceram sorrisos pequenos, apertados. Dentes deixaram-se esconder pela timidez e pela simplicidade do momento. Nenhum dos dois falaria nada. Nenhum dos dois se olharia mais do que apenas alguns segundos, segundos miseráveis comparados ao tamanho da pulsação que os dois sentiam. Ela apertava as mãos na fuga dos seus próprios pensamentos. Seus olhos estavam alagados pelo frio e faziam um poço perolado, liso e admirável. Foi quando notou que ele desviava sua atenção para inúmeros lugares mas que, no fim, já estava observando a moça de cabelos cor de petróleo, que sorria para ele. O acaso age quando sente necessidade. Ela sabia disso. Há sempre mais no acaso do que no planejado. Há sempre muito mais em se deixar levar do que contar grãos de areia pra construir um castelo. No fim, ela sabia que podia contar com a ajuda do vento não calculado pra erguer torres com o passar do tempo.

11 de maio de 2010

Dias comuns. O vento soprava mediocremente lufadas frias para quebrar o quente que nascia levemente. O café se mantinha na mesma temperatura, na mesma intensidade, na mesma mesa tosca e na mesma cadeira. A única coisa diferente era o fluxo de pensamentos que aparecia a cada cinco minutos. Eles tomavam todo espaço vago, todo aquele espaço não ocupado pela distração de tomar o café observando o dono do bar careca e seus insultos. Faixas contínuas de preocupação e de tristeza martelavam seu subconsciente, torturando, pingando devagar. Um bom método de fazer acordar para a vida, pensou. Nessas palavras, com esses pingos lentos, um a um, alagando a área mais profunda e mais sentimental da moça de grandes olhos escuros de Londres. Naquele dia os mesmo estavam marejados, piedosos, desejosos. Estavam diferente daquele negror habitual. De certa forma, pediam abrigo. Clamavam a alguém, mesmo que desconhecido, para uma troca de olhares afetuosos. Então, sentada no café, contava sua respiração. Brincava com a fumaça que saía aquecida da boca com o frio do lugar mal ambientado. Já tinha pensado em trocar de café, mas o lugar pouco lembrado e solitário a atraía como um ímã. Não queria mais ser egoísta da sua própria companhia, mas aquilo a saciava de tal maneira que os olhares afetuosos que implorava através das ruas gélidas tornavam-se infinitamente pequenos. Não sabia mais como se doar e já não o queria mais. Só observava, reunia traços e rostos, nariz e sobrancelha e passava para o papel. Transmitia a arte de sentir. Não era de ferro, era muito mais de vermelho, de sensações. Era carnal e meiga, risonha e triste, tímida e extrovertida. Dela brotavam enormes ramos de contradições.