
Sentia-se dolorida. Tinha acordado muito rápido e estava tonta. Mas nela ainda restava um suspiro quente, um resquício de vida humana. Enquanto aquilo existisse, ela estaria pronta para mais um dia. Um respirar cansado e profundo, que de qualquer forma, representava suas funções vitais com a mesma força de antigamente. Não se anulava e nem se diminuía, sabia da sua importância, embora ninguém pudesse demonstrá-la. Como se não bastasse, o céu mostrava um fino feixe de luz, só um. Naquele dia ela desejava mais do que nunca um raio de sol, um céu em cores e não em escala de cinza. O grande centro londrino estava cheio de pessoas indo e vindo, cartazes persuasivos com letras grandes, e nas vitrines, enormes letras expondo o comum OFF. Sua sombra era sua única seguidora, sua única admiradora, pelo fato de erguer-se imponente e possuir tons e arranjos próprios enquanto ela era apenas o sol barrado por um corpo e deveria estar aos seus pés por toda a vida. Aprendeu a amá-la. Esforçava-se para não lembrar, fechar os olhos e não ver, mas nem sempre era possível. O calor que recebia de estranhos era anulado pelo frio que encontrava quando seus dedos giravam a maçaneta da porta. Eram o par perfeito, o frio e o calor, a encenação e a vida real, a afetividade e a frieza, que se anulavam instantaneamente. Porém, ali o que realmente estava em jogo era o equilíbrio. Eles eram perfeitos, completos, e anulados. A chama e o gelo, mas não exatamente em todas suas formas. Elas não existem, e a isso chamam de utopia, porque sempre há aquele que doa mais do que recebe.
Fall for you – Secondhand Serenade.