
Abriu os olhos devagar, e ficou deitada na cama macia, esperando o resto da escuridão acalmar seus olhos. Devagar virou-se, encostou o ouvido no travesseiro e espalhou as pernas através de toda a cama procurando um canto gelado. De repente aquele calor que ela sentiu a noite toda exigia um lugar frio. Logo que achou, repousou seus pés devagar e os músculos que estavam contraídos agora estava relaxados. Então ela ouviu seu coração. Cada mínima batida, o compasso, a marcha lenta que fazia continuar ali. Ela conseguia ouvir perfeitamente a diminuição do ritmo quando sua respiração não estava mais ofegante. Subitamente, as batidas lentas lembraram da sua infância. Era aquela casa pequena, feita de madeira, que por dentro possuía divisórias de madeira clara, os quartos eram pequenos e uma beliche ficava no pequenino cômodo central, que tinha acesso à cozinha e à sala. Seus lençóis eram pintados de dança, um homem e uma mulher, que vestia um vestido longo, dançavam da cabeçeira aos pés da cama. Além disso, vários espaços eram pintados por listras em azul e amarelo. Seus olhos relembraram tudo isso. As batidas puxaram seus pensamentos. Era ela, com seus 9 anos de idade, sentindo-se incomodada como hoje em ouvir seu coração. As luzes apagaram e seu rostinho infantil e pacífico virou para a divisória da parede, aonde havia uma estrelinha que brilhava no escuro, como uma mini companheira. Seus rosto colado ali, em um espaço milimétrico, fazia sua respiração soar mais alta. Naquele canto frequentado por ela todas as noites de sua infância, encontrava um lugar seguro. Seu medo de criança, de monstros embaixo da cama, era denunciado pela proteção que sentia quando se isolava do restante da cama. Sentia também a mão de sua mãe tocar seus braços pequenos e frágeis, para trazê-la ao meio da cama, mas a relutância era tanta que, no fim, sua mãe a deixava com um beijo e um “Dorme com Deus e com os anjinhos” e resolvia ir deitar. Só que hoje ela dormia virada para o corredor, sem medo. Todavia, sentia falta de dormir no canto da parede, se isso significasse um beijo antes de dormir todas as noites.