Quando o dia resolveu pintar o céu com suas cores mais escuras, a noite trouxe estrelas e nuvens pesadas, que consumiam aos poucos o brilho da lua. Aquela parte menos privilegiada pela iluminação pública, que recebia casais e amigos com mais afeto do que o grande centro iluminado, recebeu-a para olhar a luz se esvaindo da porção cinza que fazia parte de seus dias. Grande parte dela, tomada pelo frio, queria voltar pra casa e deitar, como sempre fazia. Mas a outra parte ansiava por ficar ali, mesmo que o frio consumisse todo seu ar quente. Devagar, muito devagar, suas pernas foram curvando inconscientemente, seus braços abraçaram seus joelhos, e seus olhos percorreram um círculo perfeito, procurando seus pontos de referências estelares. Aquelas pequenas gostas acumuladas ao longo do dia, eram grandes nuvens pesadas, que agora já tinham consumido a lua e as estrelas. E de uma maneira graciosa, levemente pintavam sua roupa de molhado. Agora, seus olhos desfocavam de céu para chuva. Levantou sua mão e a estendeu, e na palma dela, uma poça se formou. Apesar de estar totalmente molhada devido a um ficar um longo tempo ali, levou à boca e bebeu. Lembrava que fazia isso quando era menor, no chuveiro. O gosto não era o mesmo segundo ela, por isso qualquer água era digna de ser provada. Aquela água tinha um gosto mais doce, um gosto completamente diferente da sua água infantil, e da sua água cotidiana. Quando seus músculos já doíam e seus braços estavam completamente gelados, sabia que era a hora de ir. Levantando-se devagar, ergueu os braços e balançou a cabeça para os lados, tentando parecer mais relaxada do que quando sentara ali. Conseguia olhar por fora, e imaginava o pensamento de quem a via, exatamente como fez quando passou nas vitrines naquela tarde. Extinguiu seus pensamentos, e foi para casa. Seu salto fazia um barulho cômico, na água pelas ruas. Não era a situação apropriada, mas ele insistia em fazer seus lábios sorrirem.