
O que é mais puro e perfeito que os olhos? As câmeras não conseguem capturar o que se vê ao lado deles. E como elas capturariam cada balanço delicado daquelas árvores de poucas e ralas folhas londrinas? E como capturariam também um momento pré-sono tão singelo e calmo e o som daquela música ou do silêncio? Do farfalhar das folhas secas caídas, se espalhando e se arrastando pelo chão molhado de pessoas infiéis, medrosas, corajosas, sentimentais e frustradas… Se a melodia era outra, as palavras saíam confusas e em uma desordem não habitual. E ela estava ali, tentando fotografar coisas que sua percepção conseguia assimilar e que jamais veria de novo. Tentava se explicar, justificar a si mesma, que não voltaria mais naquele lugar com aquela música e com aquele cheiro, e tentava também não se culpar por não ter isso de volta. Viver daquela maneira parecia aos olhos dos outros vazia e seca, mas o que ela queria mostrar era o modo de se viver, completamente estranho e, de qualquer jeito, feliz. Era como se viver. Quem lhe falava do céu tão colorido e criticava seu céu puramente cinza com tons avermelhados, achava que chorar era humilhante sem saber que crescia ao mesmo tempo, dizia também que era um modo difícil de sorrir. Mas ela sabia, sim, que poderia sorrir enquanto o frio estivesse ali. O que queria era encontrar alguém, precisava de alguém que pudesse abraçá-la, que sentisse como ela se sentia em frente ao frio, e desejasse o calor que ela desejava. Então, desesperadamente, pensou em voltar. Voltar de onde tinha saído. Não queria deixa seu céu. Queria abraçá-lo, queria tê-lo para sempre, queria aquele cenário até o fim dos seus dias. Era aquele cenário, aquela devoção cega, aquela utopia.