
Se recusava a possuir a mesma vida de antigamente. Se as notas encaminham um som, se a hora, na sua simples forma e sua humilde continuidade, transforma um momento qualquer em significativo e em uma importante lembrança... Porque deveria fechar os olhos e aceitar que suas mãos não conseguem simplesmente refletir seus atos? Sua defesa estava instável, qualquer coisa naquele momento, ela sentia, poderia ser prejudicial. Chorar não era seu forte. Quanto mais lamentar por oportunidades e sonhos perdidos. E seu cérebro trabalhava contra seu sistema, seu pensamento oscilava entre achar que tinha jogado seu sentimento no chão e o esmagado, e entre coordenar seus passos através da sua vida cansada de amar. Foi nesse momento, sentada dentro de sua casa (que jamais aquecia pela inutilidade da lareira), no seu tão desejado sofá verde, que começou a enxergar mais além do que já tinha vivido. Sorriu sem medo de perder esse poder de sorrir, colocou suas mãos nos cabelos e suavemente fez o contorno de seu braço. Afastou o cabelo dos olhos, impulsionou-se com suas mãos espalmadas, e levantou. E dali em diante, resolveu não acreditar no amor. Parecia frio e cruel, mas ia custar a acreditar em uma vida que não se completa com alguém, que não parte da teoria da metade da laranja. Seu pensamento não esquecia, não diluia as imagens. A nevasca que antes era leve e não passava da calçada, agora tomava proporções maiores e aquele branco transparente com gosto de frio, agora era um branco gélido, com gosto de saudade. E ela, no mais profundo sonho, ainda possuia o desejo de amar.